Ministério do Turismo e Instituto Unimed-BH apresentam
O que o meu avô, o meu tio, o meu pai falavam pra mim era que Nossa Senhora veio com os negros da África pra cá. Eu ficava: mas como é que veio? Aquele espírito veio com os nossos irmãos. Muitos se tornaram pretos velhos, muitos se tornaram negros velhos e chegou até a nossa vez.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Antigamente eu tinha essa força, aquele aprendizado dos antigos. Eu via. Quando eu dormia, parecia que eu via o Congado, os antigos me falando como é que era, o que tinha de ser feito.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
É sangue, né? Minha família, meu sangue, eu tenho que lutar pelo que meus antepassados deixaram.
Cristiane Samanta
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração de Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Todo congadeiro, o sonho dele é ir pra Aparecida do Norte, pra festa de São Benedito. Falou que é Aparecida, fica todo mundo doido
Neusa Assis
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração de Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Lá é pra pedir a benção mesmo, tem como deixar de ir lá
não. De uma forma ou de outra você tem que ir lá, pedir a benção pra começar. Você sai de lá cansado, mas você sai tão abençoado que você nem sente.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
A gente representa os índios, que vestiam penas. Mas como não tem como a gente vestir a roupa do índio porque ele num põe nada por debaixo, só uma saia pequenininha, meu avô teve a brilhante ideia de colocar uma saia maior. Mesmo porque tem de respeitar o santo e você não mostra do joelho para cima. As flechas também representam essa origem. As nossas vieram da Amazônia, no Pará, foram os índios mesmo que mandaram e fazem parte do artesanato indígena. Fizemos réplicas a partir das originais, porque a gente não pode sair “para fora” porque elas são consideradas armas brancas. Com essas, a gente não dança. Tem uma inclusive que tem veneno na ponta. A nossa farda é em representação, porque somos caboclos, ela vem representar a origem dos primeiros que pisaram aqui.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Você vê a bandeira à frente, ela tá guiando, sabe, então, por isso que a gente canta:
Ô bandeira me guia, me guia, me guia
Ô bandeira me guia.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
Tudo que eu peço, Santo Antônio me ajuda. Não é uma
pessoa que podemos comprar um presente e agradecer, uma calça jeans, uma camisa… levantar bandeira é para agradecer.
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
O levantamento de bandeira é a ligação da terra com os céus
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O que é a bandeira de aviso? Eu estou comunicando, oficialmente, ao céu e à terra que dali a 15 dias, naquele local, vai ter um festejo pra Nossa Senhora do Rosário
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Então a bandeireira tem essa função, de estar com a bandeira de guia recebendo, porque ela tá carregando a bandeira. É informação. Ela tá informando pra todo mundo:
a guarda tá chegando.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O significado daquele bastão pra gente é como se fosse o cajado de Moisés. É uma madeira que se prepara e, para nós, passa a ser não um toco de pau, passa a ser uma madeira importante, uma madeira sagrada. Através daquilo ali que você faz os seus pedidos. E o que ele representa para quem não sabe essa parte da história, é o seguinte: se você tá com o bastão na mão, você é comandante da guarda, tem voz de comando.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Você vê nas guardas aí muitos meninos com bastão. Aquilo é simbólico, né? É um pedaço de pau simbólico. O bastão mesmo é aquele que tem os três anéis, que é firmado, que contém as três coisas mais importantes do Reinado que é fundamento, sacramento e mandamento.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
É uma guarda de índio e meu avô, por ser descendente de índio, na linguagem dos jovens: o velho tinha a manha.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
E hoje os meninos sabem tocar a embaixada original. Que se faz pro Divino, que se faz quando está puxando um Reinado, quando se vem com a sua corte. Porque os caboclos não têm Reinado, a gente tem corte, tem imperador e imperatriz do Divino.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Tem três caixas, tem guarda que coloca até mais. Dentro do mandamento são três caixas, que são os três tambores, são duas de guia e uma de resposta. As caixas de guia têm uma função muito específica: são elas que vão dar o tom, o ritmo, entrar certo no canto do capitão. Não pode entrar descompassado, né? Fora a questão religiosa que você vai estar pedindo a benção, chamando o seu santo para estar ali junto com você. A gente fala que a caixa tem que falar e, de fato, a caixa tem que conversar mesmo.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O candombe é pai do Reinado, é pra ser respeitado nas irmandades como trono superior, mas é segredo do Reinado, esse Reinado que eu aprendi é herança do meu pai, hoje é dos meus mais velhos e eu não abro mão pra ninguém.
João da Cruz
Guarda de Congo Nossa Senhora do Rosário do Serrano, em Salve Maria
O candombe é o que formou o moçambique, é o pai do moçambique. Aí criou o candombe. Do candombe, fez o moçambique, do moçambique, marujo, do marujo fez o marinheiro, do marinheiro fez o pacunda, catopê, catopé, tudo isso saiu dessa pequena que tirou Nossa Senhora do mar.
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
Eu cheguei na beira da praia
E eu vi candombeiro chorar
Não chora não meus irmãos
Que eu vou e torno voltar
Se Rosana ajudar, eu torno a voltar.
A bença mamãe
A bença papai
Um abraço aos meus irmãos
Que eu vou e torno a voltar
Se a vida ajudar
A palavra candombe, que eu não entendo bem o dialeto africano, eles falavam que na África chamava batuque. Na hora da festa, da alegria, batucava. O sagrado era quando eles queriam fazer alguma coisa pro senhor, eles faziam na crença deles, eles batiam, batucavam, mas não era uma brincadeira que era pra todo mundo. A história conta do chicote: o branco batia no negro, mas doía era na esposa dele. O negro apanhava, mas quem sentia a dor era ela, justamente por causa desse lamento.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
Candombe são os mais velhos, são os nossos mais velhos. Você não vê candombe de jovem, só de gente mais velha. E isso é uma raiz muito pesada, isso tem história demais, então não é qualquer um que quer pegar um candombe para tocar.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Capacete é proteção e, ao mesmo tempo, ornamentação. Em todas as manifestações religiosas de matriz africana, a cabeça sempre foi protegida como templo. Candombeiros usavam chapéu de aba larga, moçambiqueiros, turbantes, o congo e os catopés, capacetes com espelhos e fitas multicoloridas, remetendo aos índios brasileiros, os caboclos usam penachos.
Maurício Tizumba
Os capitães são pessoas treinadas para louvar, para orquestrar o louvor a Nossa Senhora.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Não é só ter título de capitão. Quando você está no Congado é uma coisa de raiz mesmo, de escravo, de negro. Eu, quando eu tô ali, quando eu tô ali no meio, eu tô lá para o Congado, para Nossa Senhora do Rosário. Seu semblante modifica mesmo, é uma coisa tão forte, uma coisa assim tão gostosa, que te deixa radiante, te deixa alegre.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
Quando eu era criança, eu tinha medo de chegar perto dos capitães. Tinha muita história que falava que os capitães olhavam pra você com cara feia e você ficava com dor de cabeça. Então… eu tinha medo.
Eudes Gonçalves, Seu Eudes
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Eu estou falando de guarda feminina, mas você chega aqui e vai ver quatro garotos batendo caixa – aí você vai falar assim, “uai, num era guarda feminina?”. Mas você sabe por que é guarda feminina? Porque é comandada por capitã. Pode ter dez homens batendo caixa, se o comando for de uma mulher a guarda é feminina.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Sou bisneta do Chico Kalu. Eu comecei desde pequenininha, aí na época nossa guarda tinha o reco-reco. Com sete anos eu fui coroada, eu fui bandeireira, com o tempo eu já saí, fui rainha do povo. Devido ao meu avô ter morrido, a minha tia me confirmou como capitã. Capitã e quebragalho de outras coisas.
Neide Assis
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração de
Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Essa herança, ela não é adquirida nas cadeiras, não é falada nas escolas públicas e nem na faculdade. É uma herança oral. O filho vai observando aquilo que o pai vai fazendo e vai passando pra frente. Você assenta perto do capitão, ele começa a cantar e você oberva: ele chegou de determinada forma, saiu, pediu liçença pra chegar, pediu licença pra chegar na mesa, pediu lincença pra sair, pediu licença pra agradecer, agradeceu a coroa.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Como na umbanda tem o pai de santo e ele é totalmente respeitado, na Irmandade do Rosário é o capitão. Tem a responsabilidade de carregar o mandamento e o fundamento. Cabe a ele, inclusive, sentir se o lugar tá bom, se a comida tá boa, tá abençoada, senão ele mata um exército. Ele tem que tá ligado a Nossa Senhora do Rosário o tempo inteiro. Se tiver um tiro, uma bomba, o que for, espiritualmente falando, é dele.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Congadeiro tem de casar com congadeiro, senão não dá certo não. Se você quer que a tradição continue, você tem que casar com gente que gosta. A fé tem de somar, e não diminuir. Não dá certo não, o casamento acaba e o Congado continua.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
É catupé, não catupê. Eles falam catupê dependendo da região. Na região lá pra baixo, eles falam catopê, que é um congo. Lá não tem moçambique, fala catopê.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
O festejo de Nossa Senhora do Rosário é feito com tanto amor e com tanta fé que a gente faz comida pra uma multidão de gente e ainda sobra.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
Nunca ouvi de falar festa do Reinado em que alguém saísse com fome, nunca ouvi falar. Toda vez, os congadeiros comem, os outros que vão assistir a festa comem, quanto mais tira, mais a comida rende na panela, sabe? É misterioso.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
Em festa de Reinado você pode ter um pacote de feijão e de arroz, você vai lá e faz aquela comida porque você tem a plena certeza que aquela comida vai dar pra todo mundo que chegar. A gente não peleja porque tem a confiança, porque Nossa Senhora manda, Nossa Senhora resolve.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Eu sempre falo: não fica sem comer, nem que seja um pouquinho. Comida de Nossa Senhora do Rosário, de São Benedito, nem que seja um pouquinho você tem que comer dela, que ela tá… como é que eles falam? Tá com o axé.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O Congado é um apelido global. As pessoas que não têm muito conhecimento falam: “eu vou na festa de Congado”. Vamos pro lado de Aparecida eles falam Congada. Costumo brincar que congada é quando você pega naquele sapato que chama conga e bate na pessoa. No Congado tem as hierarquias: moçambique, catopé, marujo, congo real, congo de viola… Tem tudo isso. Cada um saiu de uma parte da África, mas o Reinado que é de Nossa Senhora. Congado é um apelido que pegou.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
Quando você tá ali dançando o congo, você tá festejando, porque o moçambique é o lamento, o lamento negro, do escravo, lamento do sofrimento. E o congo é o festejo. Tá festejando a sua liberdade, tá festejando a sua liberdade de direitos, até mesmo de entrar na Igreja, coisa que não era permitida.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
As danças do congo eram danças que eram feitas de luta, era como eles treinavam, era como era treinado o exército de defesa dos castelos dos reinos, que eles sabiam se defender e sabiam atacar. Então, esse ataque, essa defesa, foram transformados em dança. De certa forma, não deve esquecer nunca o porquê daquilo, a origem daquilo, que é uma dança que te mostra o ataque e a defesa.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Nós consideramos que a guarda de congo é uma anunciação, um chamado maior pra festa. É aquela que dá o brilho na festa.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
A palavra congadeiro surgiu quando foi criada a Comissão Mineira de Folclore, em 1948. Não podia ser Reinado de Nossa Senhora, porque é uma coisa pública e não passava. Botaram o nome de Congado por causa de Chico Rei, que foi rei de Ouro Preto, chefe do Congado. Foi ele o primeiro congadeiro registrado em Minas Gerais. Então fizeram. Primeiro tiraram as festas do Reinado de Nossa Senhora do Rosário, puseram Congado, por causa justamente do Chico Rei, que diz que veio do Congo. E aí mudou. Tem muito lugar aí, muitas regiões, que não aceitam a palavra Congado. É Reinado.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
Quando foi descoberto o Reinado que eles foram tirar a Nossa Senhora do mar, quando ela apareceu, foram três homens e uma mulher. Na língua d’ocês é Maria Conga, mas tem nada dessa bobajada, é Nanã que essa mulher chamava. E ela ficou como Rainha do Congo. A primeira mão na coroa de Nossa Senhora foi dessa rainha, por isso que rainha é dona de coroa.
Capitão Matias
Irmandade Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, em Salve Maria
Dizem que eles eram duas crianças e que quando adoecia alguém elas iam, benziam, davam bala e a pessoa melhorava. O mesmo rei lá de São Jorge, Dioclesiano, dizem que mandou decapitar ou mandou prender elas separadas. Tem gente que conta outra história, dizendo que eram dois doutores.
Cosme e Damião, vem cá, quem tá
chamando sou eu
Cosme e Damião, vem cá, quem tá
chamando sou eu
Eu já vou já mamãe, eu já vou já
Tem paciência, mamãe, que Deus te dá
Eu já vou já mamãe, eu já vou já
Tem paciência mamãe, eu chego lá.
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Tudo passa pela minha mão. Deus toca em mim, quando eu vejo que vai faltar alguma coisa, já estou com a panela pronta. Eu não trabalho sozinha, isso eu falo mesmo. Não sou eu que cozinho, quem cozinha é São Benedito. Fazer esse tanto de comida? Quando eu paro e olho, penso: não fui eu que fiz.
Neusa Pereira
Guarda de Congo Feminina Nossa Senhora do Rosário do Bairro Aparecida
O menino mexe quando escuta o som da caixa tocando, ele mexe dentro da barriga da mãe, ele batuca, ele pula – e no ritmo! É uma coisa fora de série, que a própria mãe não tem sossego, você já sabe que aquela criança é do Reinado.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Eu já nasci dentro do Reinado. Minha mãe contava que a parteira que ficou com ela quando eu nasci falou com a minha mãe assim: se for homem, você dá ele pra mim, mas se for mulher, você faz o que quiser, porque, se for homem, eu vou batizar ele na pia batismal da Irmandade Nossa Senhora do Rosário, no Santíssimo Sacramento da Barra do Jequitibá. Cumpriram essa missão.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
Guarda de Congo Feminina Nossa Senhora do Rosário do Bairro Aparecida
Quando eu era pequeno, diz que nós saíamos, eu e meu gêmeo, saíamos correndo pelados pra dançar quando o Congado batia. A primeira vez foi lá no Anchieta ainda, lá
no bairro Anchieta, não podia ver uma batida que ele já saía correndo, no meio do Congado.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
E a minha trajetória é essa, aqui nessa casa, desde os cinco anos de idade a gente já participava da festa. E já era aqui, na responsabilidade nossa, da família – porque pode ser menino pequeno ainda, mas também tem uma funçãozinha, pode ajudar a descascar um alho, catar um feijãozinho, botar uma aguinha no pote e aí vai indo.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Quando a mamãe fala que nasci um mês antes da festa do Rosário, eu nasci 13 de abril e a festa foi 13 de maio, e eu já tava vestida de princesa nesse dia. Nasci na data certa para eu já estar prontinha pra vestir meu vestidinho!
Isabel Casimira das Dores Gasparino, Dona Isabel
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Depois que criou a parte de menino pra dançar, a gente tem até dificuldade de conseguir rei e rainha coroado – eles não querem ficar aqui atrás com coroa na cabeça, querem é dançar lá na frente. Hoje meus netinhos aqui querem passar a mão na caixa, bater, tocar patangome, não quer ficar como príncipe agarrado com a mãe não.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Tudo que a gente faz aqui é em prol do Congado. Todo dinheiro que entra vai pro Congado: viagem pra Aparecida, festa chegando, roupa pra fazer, comida pra comprar, transporte. E aí as coisas da casa a gente pensa “essas coisas da vida depois a gente mexe. Congado não pode esperar, a fé não pode esperar”. E aí vai. Mas se eu tiro muita coisa da casa pro Congado, ele me dá tudo de volta. Vem rápido e vem em dobro.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
Teve um moço que veio cá e falou que a função dele aqui era encher os tambores de água, pra não faltar água na festa do Rosário. Então ele ia lá embaixo, dois quarteirões pra baixo, trazia água na lata de 20 litros pra encher o tambor. Não é bonito? A pessoa não tem nada pra ela fazer, não tem um centavo, mas ela buscava água, isso não é lindo? Eu acho demais, coisa mais linda, e saber que a água que ele traz é que fez a comida, que o povo bebeu e o tambor sempre cheinho.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Diz que tudo que se pensa, um grego já pensou
Diz que tudo que se dança, um negro já dançou
Até sem parar de pensar (assim escreveu o poeta
Ricardo Aleixo).
E eu aprendi que a força da dança é que nem oração.
A reza pro negro congadeiro, a fé, não está só nas
palavras que vêm do Rosário,
Ou mesmo só no canto sagrado que sai de sua boca,
mas está também no corpo que dança,
Porque corpo que dança reza.
Negro dançante e rezador.
Maurício Tizumba
O que move a Irmandade do Rosário nesses últimos séculos, após Chico Rei, por exemplo, após a rainha Nzinga Mbandi, que é a figura da Rainha Conga, é o laço africano. Quem colocou a cor, o som, fomos nós africanos. Fomos nós que trouxemos a figura da Mãe no navio negreiro e ela ficou no mar, ela lamentou por nós. Reza a lenda que nós viemos e a nossa Mãe veio como guia. Ela estava ali. Nos diversos navios aquele espírito de luz estava ali nos guardando, guardando a nossa dor.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Eles falam embaixada em moçambique, mas moçambique não é embaixada, no moçambique você chama de ladainha. A embaixada é uma coisa muito bonita, você fala da Rainha, da coroação… embaixada é história, são histórias bonitas.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Embaixada quase não existe hoje mais. Era uma brincadeira e tinha uma parte de magia. Hoje, tem o canto.
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
Aqui a gente faz embaixada em império dos outros, em sede de Reinado, dentro de igreja. Existe um congo de Sete Lagoas também que faz, e até muito bonito as embaixadas
deles. A gente fez brincadeiras com eles e até chama o capitão de lá de cebola. Ele até brincou também: “ah, neta de João Porém e filha de Cesária tem que saber fazer embaixada”. Ele cantou uma para eu responder ele, e eu disse “cê tá achando que eu não sei não?”. Aí ele: “é né, você tem carta na manga, né?”. Uai, não sou neta de quem sou, não sou filha de quem sou? Então!
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
A minha vó acreditava que aquela escravidão tinha sido acabada, que tinha realmente sido extinta, que aquilo não existia mais. Era o que ela acreditava. Lógico que, simbolicamente, houve mesmo uma libertação, mas a gente sabe hoje que foi uma coisa fictícia. Mas o símbolo de ser liberto para os nossos antepassados, de terem acreditado que nunca mais iriam passar por aquilo… o que eles sentiram naquele dia deve ter sido gostoso demais. Pensar que nunca mais ia acontecer aquilo!
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Naquele tempo, já me contaram e eu cheguei à conclusão que é verdade mesmo, tinha a escravidão, negro era escravo do branco. Era oprimido, oprimido, oprimido…
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
A minha avó foi me preparando e na hora que ela viu que eu estava pronto, aí ela me deu a espada.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
As Irmandades do Rosário são divididas em fileiras. Por que são fileiras? Por que é irmandade? Por que é guarda? O nosso tratamento é de um exército. A gente defende Nossa Senhora do Rosário.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Desde o momento que eu fardo, pra mim é tudo de bom. A farda significa assim, pra mim, respeito, não é uma roupa comum, significa dignidade, principalmente. Não sei explicar. Colocando a farda eu me sinto uma pessoa grande, muito importante porque eu sei que pra Nossa Senhora do Rosário eu sou muito importante. Não que ela me vê com outros olhos com outra roupa, mas acho que com a farda ela me vê melhor. Sei explicar não, mas eu me sinto muito importante.
Neide Assis
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração de
Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Quando a gente arruma, parece que muda, parece que entra outra pessoa na gente. Quando a gente arruma, já vem o peso da responsabilidade, você sabe que vai sair pra louvar Nossa Senhora. Quando colocamos a farda é como se a gente trabalhasse para louvar Nossa Senhora e todos os santos. Você deixa de ser uma pessoa comum, depois que você farda
o congadeiro te trata igual.
Cristiane Samanta
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração de
Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Não tem problema mudar a roupa. Se você está com coração limpo, isso que importa, qualquer roupa que você vestir é válido. Eu tenho a roupa marrom, a roupa amarela, esse ano eu quero vestir a roupa rosa e eu vou fazer uma roupa rosa. E num tem isso de me dizer que está descaracterizando, porque não está não. Porque o que está no meu coração é o que manda. Meu coração não muda de roupa.
Efigênia Costa, Dona Efigênia/span>
Guarda de Congo Estrela do Oriente
As pessoas chegam aqui e falam: ô Eudes, eu não sou muito devoto, mas pede Cosme e Damião por mim? Eu pergunto: você tem fé? Elas dizem: eu não, mas se o senhor pedir, tenho certeza que vou conseguir.
Eudes Gonçalves, Seu Eudes
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Diferente da festa que o prefeito faz, que o padre faz, pra gente basta bater caixa, levantar bandeira que o povo vem. É relação de povo, né?
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
A guarda teve que ir renovando, renovando, e muita gente vem chegando também. Então quando a gente pensa que tá acabando, aí tá chegando gente.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
O mais jovem não quer pegar e rezar o terço, não quer cumprir a voz do capitão. Quantos mistérios tem o rosário? Quantos mistérios tem o terço? Ele não sabe. E assim vai acabando, vai acabando a tradição do Reinado. Mas o Reinado de Nossa Senhora do Rosário não acaba não, fica fraco, mas não acaba de jeito nenhum. Ele é poderosíssimo.
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
O povo fala, o Reinado tá acabando, o Reinado vai acabar. Nós vamos acabar, o Reinado não vai acabar. Congadeiro é isso mesmo, né? Sempre foi pouco. Têm épocas que a guarda tem mais, têm épocas que tem menos gente. E se todo mundo gostasse de Congado? Os evangélicos têm que fazer a oração deles, os outros também têm, os centros espíritas precisam do povo. A gente tem aqui o que é nosso e vai ser sempre nosso. Ele dá uma voltinha lá, mas depois volta.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
A gente vai morrer, todo mundo aqui, mas já está avisado, aqui vai ser a casa do Congado. Aqui vai ficar esta casa. Ninguém irá vender, ninguém irá tirar nada. Mesmo que não tenha mais a guarda, isso aqui, esse espaço, essa casa vai ficar, procê vir aqui rezar um terço, para as pessoas poderem vir. Pelo Congado.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
Sua gunga no pé é uma arma. Geralmente, também quem tem as gungas são os capitães, geralmente. Se tiver um vassalo que sabe tocar bem, bater certinho, ele pode usar.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
É também a representatividade de São Benedito. Nós usamos a gunga que São Benedito usava, era o cincerro, né? É pra falar da nossa força e pra ditar ainda mais a força do Reinado. Antes, éramos presos. É pra festejar a nossa liberdade através da sonoridade.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Você não bate a gunga de qualquer forma. Ela tem um momento certo, tem que ser em sintonia. O capitão, quando vai começar, ele acabou de se fardar, ele chama a sua ancestralidade batendo a sua gunga.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Nenhum termo encontrado com a letra “H” .
A partir do momento que você passa a fazer parte de uma irmandade é como se você fizesse parte de uma família. Você precisa ter responsabilidade pelo nome daquela irmandade.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Às vezes, você não pode contar com o de casa, por isso que se torna uma irmandade – porque a pessoa que vai chegando, vai se tornando irmão, irmão do Rosário, irmão do Reinado. Não é uma coisa consanguínea direto de veia, mas é uma herança astral.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Muitas pessoas acham bacana, “é lindo, arrepia, quero saber e tudo mais”, mas tem uma coisa que é instrínseca da irmandade, tem algo que é intrínsceco de quem nasce dentro da Irmandade do Rosário.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Nenhum termo encontrado com a letra “J” .
Nenhum termo encontrado com a letra “K” .
Nenhum termo encontrado com a letra “L” .
Marcha compaceada, ê marchada longa
Essa marcha é dos pretinhos, oi
que vêm da cidade de Aruanda
Congo invém, congo invém batendo
Congo invém, congo invém batendo
Congo invém dizendo, dobra a marcha ô maria
Vou tocar uma marcha grave na casa do rei de Angola
Vou tocar uma marcha grave na casa do rei de Angola
Vou tocar uma marcha grave, vou tocar uma marcha bem bonita
na casa do rei de Angola
Vou tocar uma marcha grave, vou tocar uma marcha bem bonita
na casa do rei de Angola
É mais alegre, mais extrovertida, é mais solta. A meninada gosta mais do marujo. Se for pra montar um moçambique, não dou conta… é muito lerdo. Cada um tem um jeito.
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Eu tava de sete dias de resguardo, viajando pra São Domingos de Mariana. Aí nos tamos indo, quando chega bem pra cá de Mariana, lá ia uma variante na frente do
ônibus. Parece que a dona era a mãe e a filha. Parece que o carro rodopiou na estrada, bateu no barranco… a variante ficou com as rodas pra cima e depois desvirou, ninguém entendeu como. Quando chegamos lá, ninguém tinha nada. “Vocês são o quê?”. “É o Congado de Cosme e Damião”. “Pelo amor de Deus! Passa a bandeira aqui que isso é um milagre de Cosme e Damião!”
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Tem gente que fala que não existe mistério, existe sim, se não existisse, não duraria 606 anos. É esse mistério que nos faz ficar fortalecidos desde a data que entramos ali dentro ou nos adentramos na fé.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Foram pra beirada do mar e cantaram o pai nosso africano. Quando eles cantaram, a Nossa Senhora saiu de lá e veio encontrar com eles. Quando chegou à beirada do córrego, negro falou: “e agora pra ela se secar?”. Num tinha nada pra secar, vergonha de ser negro, mas era negro mesmo, aí pegaram uma folha de capeba pra poder pegar e não sujar Nossa Senhora. Aí ela pediu um bastão. Macô tirou um facão da cintura cortou esse dedo e deu a Nossa Senhora. Pr’ocê vê, Nossa Senhora legítima tem um bastão na mão, é o dedo do Macô. Aí os negros levaram ela pra senzala, os branco suspeitaram, cortaram eles no coro, e levaram ela pra fazenda. No outro dia ela estava lá na senzala outra vez. E assim foram três dias. No que fez três dias, o senhor liberou pra que os negros fizessem seu aganazambe, que é o Deus do negro.
Capitão Matias
Irmandade Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, em Salve Maria
A história diz que ela apareceu no mar, mas já ouvi dizer que ela apareceu no rio Araruama, lá pro lado de São Paulo. Aí o negro foi, avisou o senhor, e ele ainda ameaçou “se não tiver lá vou cortar você no couro”. Foi lá e tinha mesmo. Aí eles foram, com barco, tiraram e levaram direto para a igreja e no outro dia ela não estava lá mais. Mas sempre tem aqueles que são mais próximos da chefia, né? Tinha o Pai João, que era negro trabalhador, e ele era muito chegado ao senhor e perguntou se eles não podiam ir lá tentar. Aí ele deixou. Eles fizeram os tambores com madeira já podre – não derrubaram pra fazer não – pegaram aqueles tambores e foram batendo e cantando. Diz que deu uma brisa muito forte que veio tocando ela pra fora. Aí tiraram ela, caminhou um pouco e esses negros que tavam puxando o candombe fizeram até uma brincadeira “sinhá deve tá cansada” e colocaram o santana e ela sentou. Aí fez a brincadeira – “nego velho com os calcanhar rachado, cabelo durinho e cabeça branca vai casar com sinhá loira de olho azul” e aí ela falou: “ô meu filho, essa sinhá loira é a mãe d’ocês todos”. Fez um hino e cantou que ela era a rainha dos céus. Seguiu-se a viagem, chegando lá não colocaram ela na igreja não, pediram que o senhor deixasse ela perto da senzala num monte de capim e ficaram louco para saber se ela ia permanecer ali. Lá ela permaneceu e no outro dia, eles pegaram os tambores e subiram com ela pra igreja e perguntaram se ela permanecesse lá, se eles podiam dançar três dias. Eles falaram: “se ela permanecer cês dançam o resto da vida d’ocês, a maneira de sustentar o povo nós trazemos”. E ela ficou lá três dias. A história da alvorada no Congado é desse momento que eles acordaram e acabaram de chegar com ela na igreja. Aí foram fazer a festa três dias. Todas as ações reconhecendo a humildade dela e o amor dela por toda a pobreza. Todo mundo resolveu homenagear ela e aí se criou a guarda de moçambique, a guarda de congo, catupê…
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Quando foi no outro dia, ela amanheceu na senzala dos negros. Aqueles negros eram filhos dela. Aí então o senhor falou assim, “o que nós vamos fazer pra santa ficar lá na igreja dela?”, aí os negros falaram assim: “ô senhor, é muito fácil, o senhor tira a Isaura do castigo que ela fica na igreja”. A Isaura era uma menininha que estava de castigo porque que tinha feito erro. Aí o senhor falou para eles suspenderem ela, soltarem ela, e levou a santa pra igreja.
Dona Bela
Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário e São João Batista,
em Rainha Bela
Tinha um que era mais inteligente, Deus deu a luz pra ele, aí o filho desse negro que era mais inteligente viu numa praia bonita a santinha, no cantinho, toda iluminada. “Ô pai, olha lá, que bonito!”. Falou com o patrão que tinha visto a santinha na ilha da
praia. “E o que nos vamos fazer pra tirar essa santa de lá?”. “Vamos fazer uma festa”. Cantou, cantou, mas ela nem mexeu, ficou quietinha. Aí minha filha, fizeram as caixinhas.
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
Foi na beira do mar,
foi que nêgo chorou
Foi na beira do mar
foi que nêgo chorou
Quando viu nossa senhora saindo das águas coberta de flor
Aê Angola…
Aê Angola…
A gente tem a junção do Espiritismo e do Congado por causa dos pretos velhos, tudo nasceu deles. Eram os escravos que fizeram o candombe, porque o Congado nasceu do candombe. Que eram os batuques que eles faziam, que eram os tamborzinhos que eles faziam a partir dos troncos de árvores, e os couros secos dos animais. Foi quando eles acharam o corpo de Nossa Senhora. Pescaram o corpo, depois a cabeça, levaram para a capela da senzala e ela voltou para o rio. Para tirar ela do rio, foi o candombe que cantou ela e adorou ela em yorubá, porque eram negros africanos, ali ela saiu. Aí ficou sendo a santa do Congado. Todo o Congado nasceu do candombe, que hoje você quase não vê.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Tudo que a gente faz aqui é em prol do Congado. Todo dinheiro que entra vai pro Congado: viagem pra Aparecida, festa chegando, roupa pra fazer, comida pra comprar, transporte. E aí as coisas da casa a gente pensa “essas coisas da vida depois a gente mexe. Congado não pode esperar, a fé não pode esperar”. E aí vai. Mas se eu tiro muita coisa da casa pro Congado, ele me dá tudo de volta. Vem rápido e vem em dobro.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
De Nossa Senhora do Rosário cada um tem uma história, né? A verdadeira mesmo, quem sabia levou.
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Hoje também nós aprendemos que a palavra maçambique e moçambique é diferente uma da outra. A gente ficava ensinando pros pais e avós: “não é assim que fala, pai”. Você vai corrigindo e você corrige porque acredita que está certo. Mas, na verdade, eles que são detentores da língua e sabiam exatamente o que tavam falando… Hoje, a gente sabe que a palavra exata é maçambique, porque é uma dança sagrada. Vem de maçambe.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
O moçambique é muito pesado, é perigoso, invoca muitos antepassados, e eles são presentes ali. O moçambique que eu acho verdadeiro é o que eu vi primeiro, é o moçambique que dança redondo e não faz meia lua. E também cujo rei e rainha só ficam de face, eles não viram as costas não pro rei e pra rainha. Agora esses outros que tá aí é misturado, um tá cantando canto de congo no moçambique, o outro canta o congo. É uma misturada. Do jeito que a coisa vai desenvolvendo, vai crescendo, vai se desvalorizando. Desvaloriza a tradição e o princípio. A gente vê aí, os meninos novos com bastão na mão.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
Antigamente tinha um detalhe: garoto novo dançava na guarda de congo, moçambique era só os camundongos velhos, depois é que foi abrindo. A meninada com o bastão aqui desde pequenininho, batendo pé.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
O moçambique, ele tem o turbante virado pra frente, as gongas no pé, que são as campanhas, que ditam o ritmo. Então tudo mostra de onde ele veio, ele veio de um lugar que pratica a dança sagrada. O moçambique é uma dança de louvação.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Toda vida eu gostei do moçambique, de ouvir as gunga bater. E o moçambiqueiro é dono de coroa, o moçambique é filho do candombe.
Dona Bela
Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário e São João Batista,
em Rainha Bela
Os moçambiqueiros são os únicos que podem representar os candombeiros. Acima os candombeiros e abaixo os moçambiqueiros. Somos nós que trazemos o trono coroado. Aquelas pessoas coroadas ali representam os santos, somos nós que temos a autoridade religiosa para trazer os santos, para puxar os andores.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O moçambiqueiro não corre de jeito nenhum, não pode correr. Olha quem ele tá trazendo? Ela não correu.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Moçambique é coisa de preto velho
e anda de vagarinho,
Moçambique é coisa de preto velho
e anda de vagarinho,
Quem andar com preto velho
nunca vai andar sozinho.
O moçambiqueiro não fica à toa, né? Ele usa turbante na cabeça, toalha no pescoço, gunga no pé pra puxar coroa. Ele não fica à toa porque ele não vacila.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Eles chamavam ela de Bárbara Heliodora do Reinado mineiro, porque ela lutou e venceu.
Isabel Casimira das Dores Gasparino, Dona Isabel, sobre sua mãe, Dona Maria Cassimiro das Dores, que fundou a guarda em 1944
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Naquele tempo não se usava calça esporte pras mulheres, não tinha calça de esporte, era só vestido ou saia. Como é que uma mulher vai colocar campanha no pé e bater campanha de saia? Não tem jeito. Mas aí depois aceitaram. Tem mulher aí que faz mais que um homem, tem condições, tem competência e faz mais fácil que um homem. Aí nesse ponto tá normalizado, graças a Deus – todas as mulheres que vão dançar põem uniforme, camisa e calça comprida. Pode pegar campanha, uma espada, um bastão, tem problema nenhum.
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
Mulher não foi feita pra dançar moçambique. A mulher não foi feita pra dançar moçambique, com a campanha no pé e tudo, e nem pegar em bastão. Mulher não foi feita pra colocar campanha no pé não.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
Me dava uma tristeza quando meu pai saía pra dançar Congado e eu tinha que ficar tomando conta da minha vó… torcia para ela morrer. A primeira mulher a dançar Congado fui eu. Casei para ele me ajudar com a guarda.
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Teve uma hora que não teve jeito, a mulherada tava fundando moçambique e virando capitã. É o que a gente tem hoje. Foi muita resistência, viu? Foi natural porque o mundo empurrou, mas foi complicado, porque o lado machista falava mais alto. Há uns 10, 15 anos pra trás a mulher cantando na guarda de moçambique, um outro capitão ou queria demandar com ela ou passava direto.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
No início foi até um pouco difícil de encontrar, mas hoje é cheio de mulher. Só da minha cunhada são sete mulheres que são da guarda, ela e mais seis filhas. As mulheres é que estão dominando o mundo. É a força das mulheres. Tem problema na vida? Tem. Mas a mulher pega e faz, porque ela tem de encontrar força.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
No Reinado não tem como você estudar música. No Reinado você aprende é no ouvido, no querer, no vibrar, né?
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
Ali ó, de branco e bege. De bracinhos abertos, com os anjinhos no pé. É protetora dos moçambiqueiros. É uma santa branca. E menina, jovem, cê sabia disso? A história dela é muito complexa e cada um sabe dela de um jeito. Ela não é a Nossa Senhora Aparecida não, ela não foi achada no rio.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Cada guarda tem o seu santo, mas todos somos de Nossa Senhora do Rosário.
Maria das Graças Gonçalves, Dona Maria das Graças
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Nossa Senhora do Rosário, oi ela é a rainha das flores
Lá no campo do Rosário, onde ela se embarcou
Foi lá no campo do Rosário, onde ela se embarcouO principal disso tudo é a fé em Nossa Senhora do Rosário.
E não seria tão importante, não teria tanta importância, se não fosse a fé nossa em Nossa Senhora do Rosário. Então, a gente dança é pra ela. Eu danço pra Nossa Senhora do Rosário e quando eu tô dançando pra Nossa Senhora do Rosário não vejo ninguém na minha frente, sabe? Porque eu tô ali pra ela.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
nclusive tem uma dona que tinha um terreiro lá no fim da Rua Padre Eustáquio, tinha um centro lá, e nós fomos lá pesquisar, ver se tinha alguma coisa que serviria pro Congado. Conversando com ela, ela falou pra nós “ah, tem gente que chega aqui conta que vai pr’aqui, vai pr’ali, faz isso, faz aquilo outro e não dá certo. Aí leva pra Nossa Senhora do Rosário e as coisas pra ele melhoram. Então, ele cumpre a promessa dele e fica no Congado. Quando vocês vê um branco no Reinado, vocês podem contar que ele tá pagando uma dívida que ele deve pra Nossa Senhora”. E eu creio nisso, porque se não fosse a fé em Nossa Senhora não existia mais isso não, 300 e tantos anos, quase 400 anos.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
Ô minha mãe,
ô minha mãezinha,
Ô minha mãe,
ô minha mãezinha,
Lá no céu
Cá na terra
Ela é rainha
Lá no céu
Cá na terra
Ela é rainha
Ela é a Mãe dos negros, nossa Mãe misericordiosa, que nos atende nas nossas aflições. Atende aos que têm fé e aos que não têm também. A gente pede pelos que não acreditam e ela acaba sempre rogando por eles também. É uma Mãe misericordiosa.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
A coroa maior é de Nossa Senhora do Rosário. Quem tem Reinado é só Nossa Senhora do Rosário.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O mais velho falando, o mais novo aprende. Por mais que ele já tenha ouvido aquilo várias vezes, ele vai reafirmando a história, porque a nossa história só é viva porque ela foi falada, contada, porque não tinha como ser escrita, ela foi guardada na mente, né?
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Os nossos antepassados não sabiam letras. Minha bisavó veio em navio negreiro, foi ama de leite, não sabia ler nem escrever. O que ela passou para o filho foi oral.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Minha mãe não contava história para gente, mitos, essas coisas. Ela era menos de contar história, era mais caladinha, e mais de manter viva a tradição. Ela pegava e fazia, corria atrás, para arrumar um dinheiro para comida, para as roupas, não deixava morrer a tradição. Ela ensinou a gente a história mantendo viva a tradição, não deixando a guarda cair.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
A festa começa no domingo de Páscoa, quando a gente abre o Reinado. A partir dali a gente tá em festa, a gente tá em festejo por Nossa Senhora do Rosário.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O patangome é mais um instrumento sagrado e de resistência do povo negro congadeiro. Tem o formato de bateia. É tocado como se estivesse bateando e na música do mundo sempre existe um instrumento com a mesma função: a de unir e emoldurar e conduzir o ritmo. Quando eu era menino o preto velho Luiz Carolino gritava assim: “chitangome!”. Aí o patangome era o primeiro a ser tocado, depois vinham os outros instrumentos.
Maurício Tizumba
Ser presidente é isso: é manter o nome, é ter postura, é ser severa, é ser meiga, tranquila, nervosa, é ser diplomata – porque tem que saber administrar conflitos, tem que estar preparada para a paz o tempo inteiro, para manter a paz, mas estar pronta também para administrar conflitos.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Essa guarda ressurgiu de novo por causa de uma promessa da minha tia. O meu primo nasceu e ficou 45 dias no CTI. Então ela foi na porta do hospital e pediu o Divino. “se vós me der essa honra do meu neto vir com saúde, ele vai vestir de imperador para vós por sete anos”. E aí ele saiu com vida e a gente começou a pagar a promessa para ele lá no bairro Aparecida. No sétimo ano de entregar a promessa, a Maria, do bairro Aparecida, falou com a minha tia: “agora a festa é por sua conta”. E assim foi. Faltando dez, vinte dias, o filho dela mais novo chegou de supetão do Pará, onde mora, com uma dor de cabeça. Fez ressonância magnética, que acusou um tumor no globo ocular. Isso nós pagando a promessa do neto, vem o filho. Aí eu fiz a promessa para ele. “Ô, Divino. Se vós curais ele, do jeito que ele entrou aqui com a visão dele e a cabeça ótima”. Ele tomou 72 pontos na cabeça inteira e saiu perfeito. Eu falei “ele vai ser o imperador de vós o ano que vem, que eu vou levantar a sua festa e vou botar ela na rua”. Eu tava terminando de uma promessa e já fiz outra. E aí nasceu o Congado, de novo.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Aqui a gente faz bingo, a gente faz feijoada, a gente faz pagode, sempre mantendo o respeito. Hoje é sexta-feira, estamos na quaresma. Não se come carne, não se bebe, não se suja o corpo, se reza terço. Por quê que a gente num pode fazer? Quaresma é tempo difícil, a gente já passa um tempo difícil fora dela, nela dá uma piorada. Você quer que a sua vida ande para trás? Não. Então vamos fazer um sacrifício a Deus, vamos pedir a ele. A situação já está ruim segurando a mão dele, se você soltar, vai piorar.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Hoje a gente tá com uma cabeça mais evoluída, mas de primeiro, Rei Congo tinha que ser uma pessoa de idade, de preferência de cor escura. Rainha Conga a mesma coisa, e também de determinada idade. Hoje a idade a gente ainda preserva, mas essa história de cor não existe mais não.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Eles representam o reino de Nossa Senhora porque Jesus ordenou: coroa Maria que é minha mãe, ela será rainha do céu. E ela subiu ao céu e formou o reino dela. Porque no reino de Jesus -Jesus é o supremo maior, mas no reino de Nossa Senhora estão todos os anjos e todos os arcanjos. E quem são todos os anjos e todos os arcanjos? São Benedito, Santa Efigênia, Senhora da Luz, etc.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Ô seu rei eu vim te buscar
Senhora do Rosário mandou lhe chamar
Vamos lá, vamos ver
A nobreza do nosso rei
Lá do céu invém descendo uma coroa
A coroa de Nossa Senhora
Vamos recebê-la com jeito, meus irmãos
Esta coroa vem do reino da glória
Vamos recebê-la com jeito, meus irmãos
Esta coroa vem do reino da glória
Ô Recebei, Seu Rei, a coroa de Nossa Senhora
Ô Recebei, Sá Rainha, a coroa de Nossa Senhora
Então, tem muitas histórias antigas, que são de raiz mesmo, essa é a raiz negra. Nós estamos ali com nossos antepassados. Nós sentimos, nós sentimos a presença deles, a minha avó tá ali, minha tia tá ali também, nós sentimos a vibração, você sente que tá rodeado de povo negro, de raiz, de história.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
Antigamente não tinha “irmandade” não, era Guarda de Reinado – ou o nome popular, Guarda de Congado. Mas, pra gente que cultua, era Guarda de Reinado.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Eu sou do Reinado desde menino e de Reinado eu tenho um pouco de sabedoria, mas eu não benzo. Quem tem boca não manda pedir – “com a permissão da Virgem Maria e do senhor Jesus eu te apresento aqui o trono e você pede pro santo da sua fé”.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Esqueceram que o meu quilombo foi dentro da favela. Como tá modernizando tudo, transformando tudo em prédio, eu quero saber se daqui há uns dez, vinte anos, eu quero saber onde os congadeiros vão fazer a sua festa. Porque a resistência está acontecendo hoje nos morros.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
É muito mais fácil montar um altar com as santinhas e chamar as guardas pra vir e você não é dono de nada – você mantém a sua devoção, agradece a santa e faz a sua
promessa tranquilo. Mas ter guarda é responsabilidade, porque é o nosso nome ali e a gente defende uma causa maior que é Nossa Senhora. Então, qualquer coisa que nós façamos errado, fica feio demais porque é o povo de Nossa Senhora, é o povo do Congado ou é o povo negro, é o povo preto,
é a negrada, coisa de negro. Não é assim que é taxado o tempo inteiro?
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
A arma do reinadeiro, do congadeiro, do pessoal do Reinado, do pessoal do Congado, é o terço. O rosário é a arma contra o inimigo.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
O Rosário de Nossa Senhora é o elo, é uma conta após outra, uma conta após outra, uma unindo na outra, uma conta fora do rosário não é um rosário, ela só é conta do rosário unindo, não é? É a união.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
É a parte que eu acho mais importante. Eu tenho dois, geralmente quando a gente vai usar duas fardas, raramente a gente usa o mesmo. É a proteção que a gente tem. Eu fardar e não colocar o rosário pra mim eu não tô fardada. A parte principal da minha farda é essa.
Neusa Assis
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração
de Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Ao ver o sofrimento, testemunhar o sofrimento dos seus que estavam ali, ela chorou. À medida que eles iam carregando ela e as as lágrimas dela pingavam no chão, nascia o pé da conta de lágrimas, que é a nossa principal arma. É o rosário de Maria.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
A guarda de congo pode se enfeitar, ela tá bonitinha, ela se floreia, ela põe um monte de coisinha. Como o moçambiqueiro é uma linhagem mais velha, o que os mais velhos sempre preservam? As questões do físico. Então você não deixa à mostra a parte da genitália. O saiote vem acobertar isso, vem das nossas tradições.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
Minha mãe tava grávida comigo para nascer, foi no hospital e o médico não queria de jeito nenhum fazer o parto. E ela fez a promessa. E é por isso que eu tenho esse nome, é por isso que eu amo essa santa de paixão. O médico não queria fazer o parto e então eu nasci dentro de casa. Eu nasci nos braços dela. Nasci dentro da casa dela, nos braços dela.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
Acode, acode, Efigênia, e o convento pegou fogo, ia queimar toda
gente. Essa santa bendita, com sua proteção, Efigênia entrou no fogo e saiu com convento na mão. Acode, acode, Efigênia.
Ela é a padroeira dos bombeiros. A história dela é a seguinte: se você quer adquirir uma casa, faz um pedido a ela. Se a família tá em dificuldade, tá aquela coisa, um inferninho, você reza pra Santa Efigênia porque ela que apagou o fogo na aldeia onde tava queimando todo mundo – inclusive um dos motivos de ela ter aquela casinha na mão é por conta disso. A força de Santa Efigênia tá nessas coisas. É tipo Santa Bárbara, das trovoadas. Não é trovoada de chuva não. Se tiver discórdia na família é trovoada, trovoada espiritual. Pode rezar pra ela pra evitar doença, coisas contrárias à nossa existência, mas, de qualquer maneira, tudo de acordo com o nosso merecimento mesmo, porque se você tiver que passar por aquilo, não adianta colocar na conta do outro não.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Nossa Senhora do Rosário é a santa dos negros, é a santa que protege, mas no meu coração mesmo é Santa Efigênia. Que protege minha casa e guia meu coração. Isso eu não escondo de ninguém. Por quê eu deveria esconder amor?
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
Na Irmandade do Rosário, a padroeira maior é Nossa Senhora do Rosário. Quando nós adaptamos a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário no nosso seio brasileiro, nós adotamos, com o passar dos séculos, São Benedito, Santa Efigênia e Nossa Senhora das Mercês. Com o passar das décadas, vão vindo promessas, novas gerações, aí nós vamos incorporando. Tem a coroa de Nossa Senhora Aparecida, coroa de São Jorge, coroa de Cosme e Damião, vai entrelaçando.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O meu santo é todo santo, eu rezo todo dia. Primeiro, Nossa Senhora do Rosário. Segundo, São Benedito. O primeiro de todos é o Divino Espírito Santo, depois
a Senhora do Rosário, depois São Benedito.
Valdomiro de Almeida, Seu Valdomiro
O santo só ajuda se você pedir e aquele que não é pidão não recebe do santo. Tem que pedir todo dia.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
São Benedito foi um negro escravo que cuidava da cozinha em uma fazenda que a dificuldade era muita, tinha muito escravo para alimentar e a dificuldade era muita. Então se diz que os mantimentos, a comida que passava nas mãos de São Benedito, rendiam era pra três, quatro pessoas. Não se sabe o que era que acontecia que as panelas enchiam e que dava pra tratar de todo mundo. Ele fez a comida, tratou do pessoal e, na hora que deu um jeitinho, pegou a comida e ia levar pros negros que tavam escondidos, negro fugitivo. Aí, se conta a história, ele ia pela estrada afora quando os dois capatazes, que eram os vigias do senhor, encontraram com ele e perguntaram “uai, negro, onde é que você vai com essa comida?”. “Eu vou é levar flor pra sinhá”, e São Benedito abriu o avental e lá estava. Aí ele seguiu a viagem e [as flores] voltou novamente a ser alimentação.
Antônio Jorge Muniz, Seu Antônio
Irmandade Nossa Senhora do Rosário Os Ciriacos
Primeiro mistério, mistério da alegria
Segundo mistério, rezo para santana que é mãe de Maria
Terceiro, rezo para Santa Efigênia que é nossa rainha
Quarto, pra São Benedito que hoje é vosso dia
Quinto, contemplo a coroação da Virgem Maria
São Benedito me deu o rosário, para que eu possa rezar todo dia,
Para São Benedito eu rezo um Pai Nosso, pra Nossa Senhora, três Ave Maria
São Benedito é o santo dos negros, é o cozinheiro dos negros.
Nelson da Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Sagrado Coração de
Jesus – Irmandade Os Carolinos, em Os Carolinos
Arueira meu São Benedito
São Benedito que me salve nessa hora
Arueira meu São Benedito
São Benedito que me salve nessa hora
Arueira meu São Benedito
No rosário de Nossa Senhora
Arueira meu São Benedito
No rosário de Nossa Senhora
Eu tô falando o que os capitães me passaram, né? São Benedito foi santificado a um pedido de Santa Efigênia. Ele carregava a alimentação pra ela, para os escravos, e o senhor ia pegar. Teve esse momento, ela correu pra cruz, “abençoe Benedito” e ela rezando no pé da cruz teve a transformação das rosas. Ele ia ser preso por isso e, naquele momento, ele se santificou e santificado seja ele.
Geraldo Antônio da Silva, Seu Geraldo
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
São Benedito é preto, mas ele é nosso pai
São Benedito é preto, mas ele é nosso pai
Alumina meus caminho aonde as criança vai
Alumina meus caminho aonde as criança vai
Viva são Benedito
São Benedito é um santo preto e o mais milagroso. Se você agarrar com ele e tiver fé, ele não te deixa na mão não. A gente passa aperto, mas não passa dificuldade com São Benedito. O primeiro café que eu faço no dia é pra ele.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
Um pouco antes da festa é só pedir São Benedito que vem. Mas tem de pedir com fé, que chega. E chega até mais que você pode ter e tem até de doar.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
São Jorge não faz parte da corte congadeira, mas vai junto por ser canonizado, por ter sofrido, por ser mártir, e isso bate muito com nós, negros, e a gente acaba adorando aqueles santos que nos identificam.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
Minha mãe, antes de morrer, falou: “vou deixar a bandeira de São Sebastião pra você”. E eu continuo fazendo a festa de São Sebastião.
Eudes Gonçalves, Seu Eudes
Guarda de Marujos de Nossa Senhora do Rosário e São Cosme e Damião
Os toques de moçambique é só serra-acima e serra-abaixo, não tem outros toques dentro da linha de moçambique, só os dois. Sempre pro lamento, mas é serra-acima e serra-abaixo, pro moçambiqueiro.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
O tempo inteiro o moçambiqueiro lamenta. Serra-abaixo é mais lamentoso, né? Você quer descansar, você põe o serra-abaixo. Às vezes, você quer falar na linguagem dos negros de uma forma mais clara, mais explícita, você usa o serra-abaixo, que é um toque mais cadenciado. O serra-acima é um momento mais festejo, mais de louvação, a caixa vai repicar um pouco. Quando você tá louvando Nossa Senhora, levando andor, chegando na casa… eu não chego na sua casa de serra-abaixo. Sair, geralmente, de qualquer lugar, você sai de serra-acima, mas em um félito, por exemplo, só se toca serra-abaixo.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
A tradição do Congado é doce em calda. É doce de mamão, de batata doce, doce de coco, é doce de leite. A tradição do Congado é doce feito. Tanto que quando eu paguei o desejo da minha mãe, que quando eu fizesse quinze anos a minha festa seria como a rainha de ano da Maria, lá na Maria, cinco dias de festa, minha tia fez todos os doces – de laranja, de coco, de mamão, tudo dentro das latas, como é a tradição. O sonho da minha mãe era esse. Mesmo depois dela morta, eu quis realizar. E a minha missa de quinze anos foi uma missa criola, missa conga, eu vestida de debutante, porém com capa e coroa. Não tive valsa, tive as caixas tocando.
Iara Bárbara de Andrade
Guarda de Caboclinhos do Divino Espírito Santo
O talabarte, que é o pano que a gente usa no pescoço, também é para dar mais um conforto. Você tá dançando, você sua, você limpa o rosto, limpa as mãos. Seu Geraldo fala que é também o símbolo do Jesus, a toalha de Jesus no pescoço.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
As outras que são modernas, também têm o seu valor. Elas também têm a fé, elas também acreditam, administram a guarda delas de outra maneira, mas acreditam piamente em Nossa Senhora. Então eles também têm o valor deles. Todo mundo tem valor, tem lugar pra todo mundo – tem pra tradicional, tem pra moderno, tem pra quem quer pra um ano só, pra quem quer pra vida inteira. E de todo jeito é muito difícil. Não precisa achar que por ser moderninho vai ser mais fácil pra eles, que não vai ser, é difícil demais.
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
Louvar a Deus é muito difícil, o pessoal não quer aceitar as coisas como tem que ser. Tem que fazer as coisas certas, com dignidade, com respeito, com moral, sem cachaçada, sem palhaçada.
Hélio Silva
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Nova Granada
A tradição é o que eu carrego no meu coração. É as histórias de luta que eu carrego nele, as histórias de fé e devoção.
Efigênia Costa, Dona Efigênia
Guarda de Congo Estrela do Oriente
Sacramento é o sagrado, de forças espirituais dos nossos antepassados. Fundamento é das raízes, lá da África, se fala muito que o moçambiqueiro é negro bantu, uma hierarquia, uma herdança do povo bantu. Já o congo é uma descendência de outros negros que vieram do Congo. O mandamento é da mãe, Nossa Senhora do Rosário. Com essas três coisas, ele pode seguir. Ele estando com o pensamento fixado nessas três coisas, ele não vai encontrar barreira que não vai conseguir passar.
Dirceu Ferreira
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis
Pra proteger de tudo, do sol… não sei se vocês acreditam, pra proteger os seus chacras, principalmente o seu chacra fundamental, que te liga ao plano espiritual. Você tem que acobertá-lo, então, por isso, o motivo do turbante. Também para poder se tirar a questão da vaidade, às vezes você tá ali de escova, bonitinha, mas a sua vaidade tem que sair pra Nossa Senhora entrar.
Elizângela Aparecida Santana
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Bairro Alto dos Pinheiros
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As pessoas começam a perguntar “não vai ter festa não?”. Quando saímos de procissão da Igreja pra missa – que é muito bonita, o padre abre a porta da Igreja com o maior carinho, não temos problemas com isso, graças a Deus.
Damião dos Reis
Guarda de Congo Velho de Nossa Senhora do Rosário
Aqui é um bairro velho, um bairro de herança, são casas velhas, são lotes pequenos, de pessoas que já vieram de outro lugar para cá, já eram despejados. Eles começaram uma história aqui, então esse pedaço que é deles é o que eles já conseguiram, era uma conquista. Então um vivia bem com o outro, já devido a essa história. Agora não, foi morrendo, foi trocando os vizinhos. Tá chegando gente que não sabe o que é Reinado, que não sabe o que é Congado, que não tem tolerância com foguete – que a festa é uma vez no ano, ou duas vezes no ano, ou três vezes no ano, incomoda muito menos que um futebol, que é toda semana. Eles têm paciência com o futebol, mas não têm paciência com o Reinado. É intolerância, são aquelas pessoas que aprendem a entender tudo como macumba, como coisa de negrada, como coisa de preto, né?
Isabel Casimira Gasparino, Belinha
Guarda de Moçambique e Congo Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário
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